Sunday, 22 June 2008

Saudade



Sentimento que não tem tradução

Não que eu conheça além do português

Ou além de alguém

Que para sentir não tem coração

Pois sentimento é para se sentir

Por mais que se busque a palavra

Só sentindo-o intensamente

Consegue-se traduzir

Lágrima que rola na face

Nostalgia escorrendo como um rio, faz chorar

Sorriso que ilumina o rosto

Alegria ensolarada que me faz corar

Saudade sente-se de longe

Quando espaço geográfico separa dois ou mais corações

Ou espaço emuralhado, onde corações ocupam o mesmo espaço

Mas não cedem às sanções do perdão

Por isso saudade não se sente só no Brasil

Em Portugal, Moçambique, Goa ou Timor Leste

Sentimentos percorrem de norte a sul, de leste a oeste

Ininterruptamente e indistintamente, milhas a fio

Bastando ser humano

Para sentir a saudade pulsar a milhão

Então minha amiga

Cujo nome começa com céu

E termina rimando com mar

Não olhe para chão quando a saudade bater

Bata os pés no chão

Jogue os braços pelo ar

Dance preenchendo todo o salão

Assim verá em seu rosto um novo sorriso brotar

Memórias das boas surgirão para lhe fortalecer

Ventando fortemente respirarás um novo ar

Um novo céu para olhar

Um novo mar para nadar e velejar

Um novo céu e mar

Uma nova pessoa pedindo para nascer

Guilherme Ferreira

Epifania

(Trecho do filme "AMADEUS")

Momento singular
Quisera eterno
Não somente por um dia
Ou minuto
Que não faz diminuto o sentimento
Do que é epifania

Por enquanto vou contando nos dedos
As exceções que deveriam ser regra
Pois vida sem epifania
É vivida na incompletude
Desnecessária agonia
Que nos distancia da virtude
Quietude de um dia
Raro e por enquanto amiúde

Há saída todavia
Epifania não se manifesta em alma miúda
A alma há de ser generosa
Entregar-se de braços abertos
Como a rosa que se abre ao orvalho
Corajosa e despretensiosa

A entrada diferentemente
Não é pelas janelas miúdas da razão
Pois a mente é trancada a sete chaves
Por chaves que só o coração pode abrir

Chaves forjadas pelo sentimento
Que abrem qualquer porta
Porteira, portal ou portão
Trancafiados a cadeado
Por excessivos pensamentos 
A postos como sentinelas de plantão

O segredo já foi revelado por muitos chaveiros
Por meio de palavras faladas, escritas, pintadas ou cantadas
Molde que porta todo divino enviado
Conhecedor da divina linguagem
Que nem o melhor e mais inteligente enxadrista tem
Só o homem que busca a epifania
Homem com alma 
Alma generosa
Alma de artista

Guilherme Ferreira

Sunday, 15 June 2008

Muralha


Grandiosa, colossal
Beleza que os olhos dissolve
Perde-se de vista no horizonte
Pretensiosa para dividir o bem e o mal
Fortaleza que conflitos não resolve

Eterna para maravilhar
Que a chuva incessante não me barrou
Visão lacrimosa, fez lento o meu palmilhar
O céu, sim, parece que se rebaixou
Nuvens descendo em marcha
Em caravana para a este monumento se curvar

A guia a me guiar me disse:
Não adianta, único lugar que não tem começo
Não tem ponto-de-partida nem de chegada
Com incessante caminhar
Não chegaremos a lugar algum
Sim, a um ponto no meio do caminho
- Gui, você escolhe onde é o seu fim

Então caminhei
A chuva caiu, para testar a ambição
De tabela, também, veio misericordiamente
com gotas gordas a me refrescar
Empolgado e ensopado, galguei cada degrau
- Thi, tá faltando tênis com shushi na meia-noite, não?
Pensei...
O fôlego, então, aos poucos desfaleceu
O ânimo paulatinamente se esvaiu
Cansei, encontrei o meu fim
Humildemente, parei sem me boicotar
Até o momento
Pois a vida não acaba assim, nem ali

Cume, parada final
Dali, não pude ultrapassar
Uau, ufa, surreal
Paisagem intocada
Mas cheira a tinta fresca
Tela que parece que pintada por Dalí

Parei meu palmilhar
Os pés trêmulos de tanta fatiga
Restou-me a minha própria respiração escutar
Sentar, contemplar o cenário de cima da muralha
E, em meditação, me elevar

Naquele momento
Unicamente, a muralha se encontrava acima das nuvens
O meu encontro com o divino,
ela, de caso pensado, pretendia facilitar
E uma mensagem, sutilmente
Aos pés de meus ouvidos soprar:

Não há muralha maior que esta
Senão aquela que há dentro de você
Que lhe deixa inseguro
Ansioso ou em cima do muro

Muralha que separa o homem velho do homem novo
Que guerreiam em seus lados opostos, murro após murro
Muralha que criamos para nós mesmos
com desnecessária imaginação
Mas muralha quebrantável
Por um único desejo
Inalienável e verdadeiro
Bem intencionada
Forte, extensa e grandiosa
Ação

Guilherme Ferreira

Sunday, 8 June 2008

Beatriz



Onde está Beatriz?
Sei que estás por perto
A um passo, sem que ocupe o mesmo espaço
Ao alcance, como por um triz

Sentidos à flôr da pele, de lis
Um olhar sem precisar falar
Em tua presença, coração bate em aperto
Escutar sem parar, perder a noção do tempo
Deixar na alma os sons de sua voz penetrar

Minha mente já voa sem pés no chão
Seu cheiro transcende olfato e paladar
A lógica perdeu a razão
Já!

Beatriz
Imaginar a sua proximidade,
Mesmo que longe
Já me faz feliz

Poucos passos
Parecem milhas adiante
Um andar ou quatro
Não importa a distância
Se a minha mente a ti pode me transportar

Espero em esperança
O momento certo para me aproximar
E dizer que encontrei Beatriz
Sempre ali ao lado,
Sem perceber, como que por um triz
Direi, então:
Para ser mais que já sou, sem ti
Agora contigo
Serei mais feliz